Afonso Henrique de Lima Barreto nasceu no Rio de Janeiro em 13 de maio de 1881. Frequentou a escola pública, passando depois para o Ginásio Nacional. Completou os preparativos para o curso superior no Colégio Paula Freitas e ingressou na Escola Politécnica do Rio de janeiro, que teve de abandonar, para incumbir-se dos cuidados do pai, que enlouquecera. Passa a trabalhar na Secretaria de Guerra, para sustentar a família. Isso não impede que ele frequente a boêmia e os meios intelectuais cariocas. Militou também na imprensa anarquista. Em 1914 foi internado em hospício, e mais uma vez em 1919, quando já estava aposentado por invalidez. Faleceu no Rio de Janeiro, aos quarenta e um ano, no dia primeiro de novembro de 1922, vítima de ataque cardíaco.
Lima Barreto é o romancista mais importante do período conhecido como pré-modernismo. A crítica tem chamado a atenção para seus defeitos de estilo, incorreção devidas à pressa e ao descuido, mas ninguém lhe nega a grandeza de propósitos e o valor dramático. Além disso, parte dos defeitos que apontaram em sua obra decorrem de uma de suas grandes qualidades: a reação contra o estilo pomposo do "beletrismo" (o culto das "belas letras", ou seja, da literatura como coisa ornamental), que caracterizou a obra de tantos escritores brasileiros do fim do século XIX e início do XX. A escrita de Lima Barreto é antiparnasiana, numa época em que o grande parnasiano da prosa, era o romancista mais prestigiado. É antiacademicista, numa época em que a Academia Brasileira de Letras era uma instituição levada a sério, pois ainda não se tornara um agrupamento de escritores conformistas e políticos poderosos e vaidosos. Contra a linguagem "rica" e o gosto da palavra encantatória, praticou um estilo simples, jornalístico, às vezes panfletário.
Lima Barreto elaborou uma sátira incisiva de seu tempo. Modelou no romance alguns de nossos maiores problemas, como a questão da indiferença, do preconceito racial (era mulato e sentira na carne a navalha da discriminação), do nacionalismo ornamental, da depravação moral e política das elites, das diferenças brutais entre as classes que compõem a sociedade brasileira do começo da República. Nele a vocação dramática faz com que a ação narrada rapidamente se volte para os grandes lances de significação suprapessoal. A rigor, não foi nem um ressentido, nem um populista, como costuma ser pintado hoje. Foi um intelectual que conseguiu trazer para a literatura a voz reprimida das camadas pobres da população, graças a sua profunda empatia com o mundo suburbano do Rio, a que esteve sempre ligado. Foi, também, um dos escritores que mais nobremente exerceram entre nós a crítica intensa e corajosa.
Em sua obra se destacam sobretudo três romances: Recordações do Escrivão Isaías Caminha (1909), Triste fim de Policarpo Quaresma (1915) e Vida e Morte de M.J. Gonzaga Sá (1919). O livro inacabado, baseado em suas memórias do hospício, Cemitérios dos Vivos, constitui um impressionante documento humano.
Texto original de Francisco Achcar, publicado na introdução do livro Triste fim de Policarpo Quaresma. São Paulo: Objetivo, s/d.
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